quarta-feira, 10 de outubro de 2012

Que Maravilha - G. Lacombe

Chovia. Muito. Parecia que Deus estava mandando o segundo dilúvio à Terra. Dentro do carro, ele não conseguia enxergar mais que uns cinco metros a frente mesmo com o limpador ligado no máximo. Dava sorte da previsão ter alertado a população e muita gente não ter saído naquela sexta-feira. Ele precisava sair.

Esqueça os problemas. Não os havia naquela situação. Os dois lados do relacionamento vinham se comportando bem e o que existia, além do sentimento, era uma saudade absurda que tomava conta dos dois corpos. Explico: ela havia viajado a trabalho e tinha voltado naquele mesmo dia. Pegou um táxi, foi pra casa e ligou avisando que tinha chegado. Ele, ignorando a previsão do tempo, entrou no carro e foi em busca da amada. Era motivo de sobra para enfrentar o temporal.

Loucuras que a gente faz por amor. Uma poça escondia um buraco, uma curva quase não se enxergava, um desavisado que corria para se esconder das gotas atravessou sem olhar para o lado, e assim os perigos e surpresas iam se multiplicando pelo caminho dele. Ela esperava impaciente em casa, sabendo que os minutos demorariam a passar naquelas próximas horas.

Amor, ele ligou, tô aqui na esquina. Por que você não sobe?, ela perguntou. É que furou o pneu do carro, ele explicou. Encostei aqui - clip. Ela tinha desligado. Ele tentava ligar de novo, mas nada. Ficou tenso. Achou que tinha feito algo errado, se desesperou e a saudade o torturava. Tão perto da casa dela, mas com medo de deixar o carro ali, no meio da calçada. Ainda bem que aqui não alaga, pensou.

Foi quando viu um vulto, uma pessoa se aproximando e batendo no vidro. O guarda-chuva já não servia pra muita coisa e o vestido branco que esqueceu de trocar começava a denunciar as formas por baixo do pano. Ainda lembrou de tirar carteira e celular antes de sair do carro. Ali, na chuva, começaram a dissolver a saudade no beijo molhado que deram.

- Achei que tinha ficado brava comigo!
- Como assim? Eu só não quis esperar!
- Que bom. Tava com saudade.
- Eu também, amor. Vem, me beija!


Quem via da janela aquele casal, no meio de uma noite chuvosa se beijando com vontade, sentia uma pontinha de inveja por nunca ter vivido algo como aquilo, ou guardava bem a cena para poder repetir com um amor depois. Que maravilha eram os dois.

Ele a tomou pela cintura, deu dois giros com ela e ela sorriu. As gotas que banhavam o sorriso dos dois pareciam, agora, abençoar aquele amor. A saudade, já diluída e agora fraquinha, tinha ficado em segundo plano. O vestido dela, todo empapado.

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